terça-feira, 1 de novembro de 2011

Sob a Lona

Ventilador. No interior de Minas Gerais, a trupe do Circo Esperança viaja, cidade por cidade, para levar seu espetáculo. Em meio a poeira, calor e privações, esses artistas enfrentam cada obstáculo com o intuito de levar o sorriso e alegria ao rosto de cada morador destes lugares distantes. Valdemar/Palhaço Puro Sangue (Paulo José, vencendo o Parkinson e entregando uma atuação arrebatadora) e Benjamin/Palhaço Pangaré (Selton Mello, mostrando desenvoltura à frente e atrás das câmeras) são pai e filho, respectivamente, e donos do circo. Com a idade avançando, Valdemar passa a Benjamin o trabalho de levar o circo em frente.

Dona Zaira, a velha palhaça não tem mais sutiã para os peitos caídos. Lola, a dançarina rebola com a espada, namora Puro Sangue e embolsa a grana da bilheteria. Os cantores sempre inventam uma desculpa para conseguir um extra. O mágico vive na corda-bamba para cuidar da mulher e da filha, a pequena Guilhermina, que cresce pelo mundo convivendo com os tipos mais excêntricos sem paradeiro e com muito malabarismo para contornar as mais difíceis situações. A cada parada, novos personagens, novas histórias, novos desentendimentos.

Nesse ambiente insólito do picadeiro, Benjamin tenta encontrar um significado para viver. As cobranças dos artistas do Circo Esperança aumentam. Ele tenta fazer um crediário, conseguir um emprego, sair do circo e encontrar uma nova vida, um amor, uma identidade e um ventilador. Afinal, um rapaz já crescido que vivia perambulando pelo mundo, atravessando as serras mineiras, não tinha identidade, CPF, nenhum documento além de uma surrada certidão de nascimento.

Com uma fotografia em tons quentes e envelhecidos para nos situar numa época antiga, onde ventilador era artigo de luxo e o vermelhão da poeira contrasta com o verde das plantações e matas que são cortadas pelas estradas de chão, vamos enveredando por uma história de dor, riso, melancolia e superação. Cada quadro é como se o diretor e ator principal da obra queira fazer uma pintura, um retrato dos sentimentos de cada personagem, que reflete um período e ainda assim são emoções genuínas e atemporais. Há uma inocência marcada pelo tom onírico que a obra se desenvolve. Um ideal de que não importa o que aconteça, somos aquilo que nascemos para ser.

A câmera sempre vai dos opostos: da proximidade intimista com o personagem na tela, um detalhe, um olhar; ou parte do chão até o céu entrecortado pelos morros, num plano amplo, que faz perder a vista no horizonte. Esse cuidado visual acompanhado de atuações honestas embaladas por uma trilha prazerosa e emocional, acaba por entregar o melhor filme nacional de 2011 com sobras e um dos melhores da década com tranquilidade. Selton Mello demonstra maturidade autoral para dirigir uma obra singela que faz rir e chorar nos momentos certos e ao final, as luzes do picadeiro se apagam sob os aplausos entusiasmados do público em pé.




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