sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A Rede Social


Mark Zuckeberg, um garoto de 19 anos, viciado em informática, estudante de Harvard, sonha em entrar para os grupos finais da universidade e ser popular. Um pequeno problema o afasta de seus objetivos, além de ser um nerd, Mark não consegue ter o menor tipo de contato social sem estar visivelmente desajustado, incomodado e amedrontado. A abertura do filme, A Rede Social, de David Fincher, mostra toda essa dificuldade do jovem em conversar cara a cara com alguém e não ter nenhum tato para contato mais próximo, até mesmo de quem ele diz gostar. Esse é o ponto de partida para mostrar a trajetória do mais jovem bilionário do mundo!


Mark (Jesse Eisenberg, fenomenal) tem poucos amigos, na realidade, apenas um, Eduardo Saverin (Andrew Garfield, espetacular), um brasileiro também estudante de Harvard, com dom para cálculos e projeções. Após uma briga com Erica, Mark resolve montar um site onde podem escolher qual a mais bela garota da universidade. A partir desta brincadeira, ele é convidado pelos gêmeos-remadores Tyler e Cameron Winklevoss e o indiano Divya Narendra para organizar um site para os alunos da instituição. Enquanto, Zuckerberg começa a montar o Facebook, com apoio financeiro do amigo Saverin. Fincher costura esses fatos que transcorrem entre o final de 2003 e início de 2004, com dois processos: dos gêmeos e o indiano contra Mark por plagiar a ideia do site no qual, Saverin está à favor do fundador do Facebook e, outro onde o brasileiro cobra do amigo parte dos lucros da empresa. Afinal, após conhecer o ídolo-nerd Sean Parker (Justin Timberlake, muito à vontade), criador do Napster, Mark se deslumbra com as possibilidades visionárias do alcance do site.


Aí entra em cena os pontos altos do filme. A atuação e relação entre Mark, Saverin e Parker ditam o ritmo como a juventude atual: antenada na tecnologia, rápida e totalmente desplugada da sociabilidade real. Tudo é virtual: seja por telefone, celular, internet. A montagem é um trabalho de mestre, recortando os fatos dos dois processos. O roteiro adaptado do livro Biolionários por Acidente: A Criação do Facebook, não limita a história e entrega a todos os personagens cenas e diálogos marcantes. Como a advogada dizendo ao dono do Facebook: "Mark você não é um idiota. Mas faz de tudo para ser" ou quando temos o último elo de Zuckerberg com o mundo real quebrado durante a reunião dos advogados dele e de Eduardo, e o brasileiro diz: "Eu era seu único amigo". A fotografia é um pouco abaixo do comum para um filme de David Fincher, entretanto a cena da competição de remo é de uma beleza plástica exuberante e plácida, para depois explodir no momento de ira dos irmãos Winklevoss. E a trilha sonora de Trent Reznor e Atticus Ross emula sons clássicos com as batidas rápidas do pop atual para criar o ritmo da atmosfera que esses personagens transitavam e motivavam.


Jesse Eisenberg faz um trabalho digno de nota ao dar vida a um ícone de dois mundos: o real e o virtual. Com toda sua inicial inocência e babaquice juvenil para crescer num empresário arrogante, prepotente e sem nenhuma conexão com o mundo real. Andrew Garfield encarna um brasileiro, morando em terras estrangeiras, buscando um lugar ao sol e ainda pensa em ter a atenção do pai, sendo natural e encantador. Justin Timberlake interpreta quase a si mesmo, um rei do pop, um astro da atualidade, que mesmo em momentos de baixa mantém o prestígio entre os fãs e faz as melhores festas.


A Rede Social é um retrato da sociedade do século XXI. A velocidade das relações, a importância da tecnologia na vida das pessoas. Mark apenas queria atenção dos clubes finais de Harvard, mas teve que levar pra rede a disputa, visto que não sabia se comportar num encontro comum. Um filme que não é somente o ano de 2010, como o melhor do ano, conforme a crítica tem elogiado e premiado, mas uma obra-prima que define o início do século e as profundas mudanças que a virtualização tem deixado na sociedade. E sem medo, afirmo que o filme de David Fincher é o novo Cidadão Kane, o Kane dos anos 2000.




quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Pede Pra Ficar


Há três anos, José Padilha famoso diretor nacional de documentários resolveu adaptar Tropa de Elite para os cinemas. Adotando o mesmo estilo câmera-na-mão-ideia-na-cabeça e tomadas de tirar o fôlego sustentada por um roteiro forte e coeso, Tropa de Elite 2 supera em tudo o original e se firma como o filme nacional mais visto na história. A trama complexa culmina num clímax altamente reconhecível e nos faz entender - em partes - como o Rio de Janeiro chegou ao ponto que acompanhamos semanas atrás com as invasões nos morros.


O BOPE que conhecíamos no primeiro filme se transformou numa máquina de guerra. Entretanto, o herói Capitão Nascimento (Wagner Moura, soberbo) está amarrado pela política local e é nomeado sub-secretário de Segurança. Seu parceiro, Mathias (André Ramiro, fabuloso) é um caveira que vai preso e acaba trabalhando em outro setor após declarações à imprensa, onde encontra uma nova realidade e novos rivais: outros policiais. O filme lançado em outubro, no decorrer da campanha eleitoral, mostrou sem nenhum pudor, a relação tráfico, polícia, milícia e políticos. Uma estrutura que se auto-sustenta na dependência da outra. Como diz o sub-título do filme: O inimigo agora é outro. O sistema vai contra Nascimento, que também enfrenta problemas de relação com o filho adolescente e o novo marido de sua mulher, um almofadinha metido a socialista que se elege deputado. Escutas, traição, mortes, rebeliões.


Nesse jogo de interesses e corrupção, Nascimento percebe que seu trabalho apesar de reduzir a influência do tráfico de drogas em localidades do Rio, a criminalidade não diminui, pois quando um vilão sai, outro entra no lugar para tomar conta das favelas. A formação das milícias sob organização de policiais corruptos e com apoio de políticos é destacada nua e crua. Até o poder da imprensa sobre declarações, escândalos e mortes de jornalistas por queima-de-arquivo. Padilha constrói a cada quadro, um retrato do Rio de Janeiro, que poderia ser de qualquer outra cidade do mundo. Em Tropa de Elite 2 não vale apenas frases de efeito, palavrões e tiros, o que importa é a visão de um cineasta sobre uma realidade que nasce a cada dia diante de nossos olhos e parece que estamos inertes quanto aos seus desdobramentos.


Enfim, Tropa de Elite 2 é o maior e melhor filme nacional desde a Retomada e, possivelmente, o melhor de todos os tempos. Um recorte da realidade atual nas favelas do Rio, da influência de tudo que acontece no país, principalmente, dos calabouços do poder, onde o dinheiro move decisões políticas, policiais e do crime. André Ramiro e Wagner Moura são os protagonistas desse espetáculo, mas os coadjuvantes têm poder em suas cenas e transformam esse filme numa obra-prima tupiniquim. Do Rio à Brasília, do morro ao Congresso, uma demonstração de como a vida é regida pelo poder, pela influência do sistema. Não tem como não se indignar, empolgar e apreciar Tropa 2, é aquele filme que ao final da projeção te derruba, te deixa atônito e mesmo assim você quer ficar e assistir novamente.